Torre de Astronomia

Assim que o sol estava terminando de se pôr, Samantha percebeu que estava na hora da aula de poções. Diferente do esperado, ela não estava fazendo seu caminho para as masmorras com o livro de poções em mãos. Poção era sim uma de suas matérias favoritas, tanto pelo professor ser de sua casa e adorar Samantha, tanto pela fascinação que ela tem com a variedade de poções que é possível criarem. ‘’Conhecimento é poder’’, era o que seu professor lhe falava. Mas hoje, sem nenhum motivo em especial, Sam não se sentia com vontade de misturar ingredientes com alunos escandalosos e animados ao seu redor. Ela não tinha nada contra, só não queria estar perto deles hoje. Só hoje ela queria uma pausa de sua vida comum. Tinha medo do que poderia lhe acontecer se continuasse com esse pensamento, de que faltar aulas não era nada demais, mas tinha certeza de que poderia se explicar com o professor mais tarde, ele com certeza iria ouvir da sua aluna favorita. Apesar do que poderia dar errado, Sam decidiu correr o risco pelo seu próprio bem com medo de explodir no meio dos alunos nas masmorras – de uma forma não literal, claro.

Sua nova rota era a torre de astronomia, ela havia perguntado para a professora o dia que não haveria aulas para poder passar um tempo no local sem ser perturbada. Hoje, para a sua sorte, era um deles. Em uma de suas mãos havia um saco de doces trouxas de diversos sabores que um de seus amigos havia trago para ela depois de passar o feriado com a família. Na outra, um grande livro também trouxa chamado ‘Misery’ do Stephen King. Ele era um de seus autores favoritos trouxa, mas ela preferia manter essa adoração para si mesma, tendo em vista qual era a sua família e seu status no colégio. Ninguém sabia dessa sua paixão além da sua companheira – a mesma que trouxe os doces - de dormitório que descobriu após ver a loira lendo um livro do King. Ela andava cuidadosamente, porém rapidamente, até a torre, com o livro e o doce escondido em suas vestes e um tremendo medo de ser pega com objetos trouxas. Assim que chegou às escadas, ela tirou os objetos de suas vestes soltando o ar que nem havia percebido que estava segurando. Quando terminou de subir até a torre, um grande sorriso abriu em seu rosto.

Sam sentou no chão em frente a grande janela que havia para observar as estrelas. Mesmo não tendo nenhuma delas no céu, observá-lo era uma coisa agradável.  Gostava de perceber a dimensão das nuvens fofas e brancas, os tons claros e escuros de azul no céu e tentando ver se conseguia enxergar algo além dele. Ela criava em sua mente novas teorias do que pode ter além do céu todos os dias, o que, apesar de deixá-la totalmente confusa, era uma das coisas que mais gostava de fazer. Botou o saco de doces no chão, na frente de si, e abriu o livro. Ela deu um longo suspiro de prazer ao sentir o cheiro do livro misturado com o aroma doce das balas. Samantha alternava constantemente entre pegar um doce do saco, ler um parágrafo e olhar para o céu. O seu dia definitivamente estava melhor do que uma aula de poções.

Samantha estava acabando mais um parágrafo do livro quando uma voz conhecida penetrou seus ouvidos, causando-a pequenos calafrios de susto. Seus olhos foram fortemente fechados enquanto ela desejava que, de alguma maneira mágica, aquela não fosse a sua irmã. – Hoje não. – sussurrou o mais baixo que conseguia, como um desabafo. Abriu os olhos, soltando o ar que havia prendido. Encarou o livro em suas mãos mais uma vez, tentando mostrar que não se importava com a irmã sabendo de seus gostos – coisa que a incomodava bastante, tendo em vista que eles não eram bem vistos por seu pai. Sam abriu um pequeno sorriso de canto e arqueou fracamente as sobrancelhas, mesmo sabendo que, de onde estava, a irmã não conseguia ver sua expressão. Quando abriu seus olhos, ficou contente consigo mesma por ter lido a perfeita resposta no livro em suas mãos. – Em um livro, tudo teria ido de acordo com o plano... Mas a vida é tão fodidamente desarrumada. – citou o trecho com a voz indiferente, como se estivesse lendo os ingredientes de uma poção na aula. – Você não está nos planos, Scottie. – encarou o céu, esperando que a irmã se aproximasse, coisa que ela tinha certeza que iria acontecer.

Seu olhar caiu imediatamente sobre os doces assim que citados. Eram tubos vermelhos por fora e brancos por dentro, cobertos de açúcar, poderiam facilmente se passar por qualquer doce bruxo, mas o saco em que vinham entregava a sua origem. – Não são tão interessantes assim. É apenas alcaçuz, tenho certeza que já comeu. – deu de ombros, tentando não deixar o assunto do doce trouxa com muitas pontas soltas. Não queria que a irmã arrumasse uma brecha para fazer palhaçada com ela. Sam não se importava, na verdade, só achava desnecessário e repetitivo. – Foi um presente, pra falar a verdade. Se quiser, eu posso perguntar onde a garota conseguiu já que você se mostrou tão interessada neles. – arqueou as sobrancelhas, fingindo-se de boba como se não soubesse das verdadeiras intenções da irmã ao perguntar. – Ah, que falta de educação a minha. Quer um? – falou sarcasticamente e ergueu o saco de doces em direção a irmã, olhando finalmente para ela. O tanto que elas eram parecidas incomodava Samantha, não gostava de ter uma cópia andando por aí, mesmo que elas não fossem idênticas. Somente o fato de dividirem o sobrenome não era algo que a agradava.

Contava até três mentalmente todas as vezes que a sua irmã falava alguma coisa, o modo como ela se achava superior e com suas pequenas provocações irritava Samantha de um jeito indescritível. Usava o sarcasmo com a Scottie por isso, achava que era o melhor jeito de lidar com a sua forte personalidade. – Cancelada. E a sua? – mentiu, dando mais uma vez de ombros. Esse se tornava um gesto constante quando ela estava por perto. – Mas não é como se você me conhecesse para saber meu tipo, se for parar pra pensar. – voltou o olhar para o céu, tentando evitar o pequeno flashback que vinha a sua mente carregando lembranças de quando ela era próxima da irmã. Saiu desses pensamentos ao ter o livro tomado, revirando os olhos com essa ação. – Só porque dividimos o último nome, não quer dizer que temos que dividir as coisas. Às vezes, precisamos falar ‘posso, por favor?’’ antes de pegar algo que não é nosso. – explicou calmamente, como se estivesse falando com uma criança. – Pensei que por volta dos quinze os seres humanos deixavam de agir como animais. – respirou fundo em decepção, negando com a cabeça. Odiava provocar as pessoas, achava dramático e clichê demais, mas não podia evitar quando sua irmã estava ao redor. Diferente do que havia dito, Sam deixou que sua irmã encarasse o livro em uma tentativa de mostrar que ela não escondia nada. E era nisso que ela estava tentando acreditar.